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27/12/2013

Onde estão os deuses?






Santiago Torrente Perez

Esta pergunta parece difícil de ser respondida e é, mas depois de muito pesquisar, ler, debater e experimentar acho que posso dar uma possível resposta. Os deuses estão em todo lugar e em lugar nenhum, como na física quântica eles se parecem à luz que uma hora é partícula outra onda, dependendo da atenção e do olhar do observador.

Os mitos contados nos livros sagrados, parecem descrever simbolicamente aquilo que é constitutivo no universo, ou seja sua energia criadora, estabelecida no momento da grande explosão cósmica onde se fragmentou em infinitas possibilidades de vibração. Uma dessas possibilidades é o que conhecemos como mundo visível, captado pelos sentidos físicos, outra é a correspondente ao mundo invisível mas perceptível àqueles mais sensíveis e atentos.

Essas energias construíram e fazem parte integrante do universo, fluem por todo o cosmo, agindo de forma perceptível ou sutil, dependendo do grau de vibração que se manifestem sobre a realidade que vivemos. Embora tenhamos a ilusão da separação, estamos intrinsecamente vinculados a essas energias consciente e/ou inconscientemente. A maneira que temos para compreendê-las foi construída e dada como herança cultural desde tempos imemoriais através das gerações pelos mitos. Os deuses, o espírito de nossos ancestrais e suas manifestações foram simbolicamente transmitidas, como formas de organizar o mundo e dar-lhe sentido.

Esses seres transcendentes, poderosos e seus símbolos são o correspondente simbólico das energias que conformam, modelam e criam nossos corpos e mentes. Portanto os mitos são a forma que encontramos para compreender, interpretar e moldar as forças descomunais da natureza que nos constituem e habitam em nós.

Para poder sentir isso de forma clara sugiro fazer a seguinte experiência:
Sente-se confortavelmente em um lugar tranquilo, se for junto à natureza melhor, feche os olhos, sinta sua respiração por algum tempo e diga a si mesmo: “Deus está em meu corpo, em minhas carnes”, repita isso algumas vezes e veja como se sente.

Se realmente se permitir ter essa experiência certamente começará a ser, sentir, pensar e agir diferente.

27/12/2012

O fim do mundo não aconteceu, e agora?


O fim do mundo não aconteceu, e agora?

Santiago Torrente Perez


Ainda bem que o fim do mundo catastrófico que muita gente esperava acabou não acontecendo, o que será que nos aguarda no futuro? Bem quem me conhece sabe que não sou muito dado a previsões,  pois de modo geral quem as faz tem uma margem de erro bem alta,  mas por outro lado parece que há algo como uma transformação acontecendo, embora incipiente e paulatina., posso estar enganado mas tenho a impressão de que de alguma forma os povos do mundo estão, cada um ao seu modo, buscando alternativas para ter uma vida mais digna e humana.
Gosto de me basear no conhecimento desenvolvido por pesquisas, estatísticas, dados e as tendências que eles apontam, e segundo os últimos levantamentos muita coisa irá mudar até o final do século, nos individualizaremos ainda mais o que vai acarretar uma mudança ainda maior nas relações familiares, a tecnologia continuará seu avanço para maior integração, comunicação e controle de nossas atividades, seremos cada vez mais conscientes de nossa situação social e política tanto local como globalmente.
Mas voltando ao tema do fim do mundo, no tempo que tenho de vida essa, se não me engano,  já foi a terceira vez que o  fim do mundo é esperado e acaba não acontecendo. Acho que está mais do que na hora das pessoas se darem conta de que há coisas imprevisíveis e mesmo que acreditemos no que foi dito ou escrito por alguém que confiamos, não necessariamente aquilo é verdade ou acontecerá da maneira como interpretamos.
Acredito que nessas especulações acerca do fim do mundo ou algo catastrófico que nos tire do mapa ou nos force a mudar tem  a ver com desejos coletivos inconscientes por transformação de nossa forma de agir, ser, sentir e pensar sobre nós, os outros e o mundo.  
Algumas suposições fazem crer que a transição será amparada por seres extraterrestres, angelicais ou algo semelhante que virão para ajudar a humanidade, por outro lado há os que dizem que não há mais saída que estamos no caminho de nossa extinção e só nos cabe ir levando como podemos até o desenlace dessa catástrofe.
Pessoalmente não acredito que haja ajuda de extraterrestres ou seres divinos, pelo menos não da maneira descrita pelos profetas, tenho a impressão de que estamos aqui por nossa conta e risco, mas há alternativas antes de que cheguemos a nos extinguir.  Tampouco acredito em soluções coletivas, em meus estudos até aqui não vi que nenhum movimento dito coletivo tenha alcançado os objetivos pretendidos, na realidade todos nada mais foram do que movimentos guiados por determinadas lideranças que ao conseguir seu intuito, que era chegar ao poder político do seu grupo, deixarem de lado os ideais nobres pelos quais tinham convencido seu povo a lutar.
Até agora nossos lideres não chegaram a um denominador comum acerca de como seguir com nossa evolução planetária, e assim parecem não se preocupar muito com nossa continuidade na Terra.
Acredito muito mais na autotransformação, busca autônoma de conhecimento e discernimento pelos quais me torne um ser humano em seu mais profundo significado e que seja digno de assim ser chamado. Se todos buscassem aprender mais acerca de si mesmos e como seus processos inconscientes interferem em seu cotidiano quem sabe pudéssemos ter uma sociedade mais justa e humana.
Costumo dizer em minhas aulas que somos indivíduos, conscientes, capazes de escolha e portanto responsáveis pelo que escolhemos. Mas na verdade nossas escolhas são limitadas pelo que temos como padrão de comportamento em nossa sociedade, só podemos nos tornar mais livres e autênticos se aprendemos com os demais indivíduos e culturas formas diferentes de ser, sentir, agir e pensar.
Como já disse Einstein em algum lugar “É mais fácil romper um átomo do que romper um hábito” e ai está boa parte de nossos problemas, estamos tão habituados a certas formas de pensar e agir que achamos que estas são naturais e imutáveis.
Somos os seres menos pré-programados da natureza, mas por viver em sociedade desenvolvemos hábitos mentais e de comportamento que de certa forma conformam uma programação. Sendo que alguns deles estão necessitando uma urgente atualização às necessidades do mundo contemporâneo.
A primeira tem a ver com o processo de individualização contemporâneo: é a busca pelo autoconhecimento, desenvolvimento pleno de potenciais e discernimento. E a partir disso estabelecer uma compreensão maior das relações interpessoais, sociais e globais. Como ouvi de um palestrante há algum tempo atrás: “ Quanto mais próximo estou de mim, mais próximo estou dos outros”,  pois ao me conhecer posso criar empatia com os demais e estabelecer relações mais humanas.
Também implica de autonomia, liberdade e a responsabilidade correspondente. Este processo está sendo bastante auxiliado pelas tecnologias de conhecimento e comunicação.
Talvez enfim sejamos adultos, porque até agora temos agido como crianças ou adolescentes, que esperam que “alguém” venha resolver as enrascadas que nos metemos. Lamento mas ninguém virá para isso, quando muito nos indicará o que fazer.
Quem sabe também tenhamos uma relação mais saudável com a espiritualidade, invés de realizarmos rituais muitas vezes vazios de espírito mas cheios de ilusões, pantomimas e teatralizações, comecemos a perceber o espírito que habita cada um de nós e nos une, como a uma família, construindo enfim o paraíso na Terra. Isto vai ser um pouco difícil já que a maioria das pessoas que creem em algo estão mais parecidas a torcidas uniformizadas defendendo seus símbolos religiosos, do que realmente entender o significado desses símbolos e como podem auxiliar no sua busca da verdade espiritual.
Por favor, antes de me criticar observe como se comporta, o que anda fazendo em relação à isso. Eu respeito todas as religiões mas me dou o direito de criticar como elas são exercidas pelos seus representantes, aliás dificilmente confio em algum deles, prefiro tirar minhas próprias conclusões das minhas experiências sobre esse assunto, não aceito dogmas, normas limitadoras e antinaturais sem sentido, prefiro pesquisar muito, pois quero ter claro o que é a espiritualidade e como estabelecer uma relação melhor com ela.
Há também implicações políticas pois ao buscarmos maior autonomia e liberdade nos tornamos mais críticos de nossos representantes e vamos procurar fazer que eles se tornem mais responsáveis pelas suas ações, vindo a realmente representar nossos reais interesses. Não mais seguiremos cegamente seus discursos, espero que façamos ao contrário, eles é quem deverão seguir o que determinamos, como era feito nas tribos indígenas onde o chefe liderava seu grupo a alcançar o que este determinava.
Mas isso só será possível se cada um de nós começar a sua transformação, ou seja por fim em seu mundo ideal, dogmático e irracional, reconstruí-lo atualizando o que for necessário para seguir em frente como um ser humano pleno, pertencente a uma espécie única no planeta, mas irmanada às demais.
Então está preparado(a) a fazer sua parte?

11/01/2011

Ignorância e Lucidez

Ignorância e Lucidez
Santiago Torrente Perez
Todas as técnicas de meditação são uma ajuda para destruir o falso.
                                            Elas não lhe dão o real - o real não pode ser dado. Aquilo que pode ser dado não pode ser real. Você já possui o real só lhe falta afastar o falso.   Osho
                  

Não sei quem disse isso antes, mas o maior problema da humanidade é sua ignorância. Ela é a causa de nossas maiores desgraças e as vezes de nossas maiores alegrias, certamente mais das primeiras do que das últimas. No mundo que vivemos, cheio de fontes de informação e conhecimento, é difícil acreditar que a maioria das pessoas não tenha posto em prática sua inteligência e se deixe levar por crenças, valores, normas sem questionar de onde vieram, para que servem e se tem alguma função ainda no mundo.
E uma das situações que mais me incomoda são as manifestações de preconceito, seja elas quais forem. A mídia tem mostrado vários casos desde alguns rapazes agredidos na Avenida Paulista, São Paulo, por serem supostamente homossexuais e o caso de algumas pessoas moradoras de rua agredidas ou mortas enquanto dormem na calçada.
Mas sem julgar esses atos vamos procurar entender melhor essa questão e procurar esclarecer e dar um outro ponto de vista um pouco mais inteligente do que a repressão pura e simples contra tais atos já que esta não alcança resultados satisfatórios uma vez que essas situações continuam a se repetir.
O preconceito é algo aprendido, ninguém nasce preconceituoso, basta ver crianças brincando num parque onde tenham contato com semelhantes de diversas origens, com problemas físicos ou mentais. Elas não fazem a menor menção de exclusão das pessoas que são diferentes, só terão esse tipo de comportamento se tiverem visto um adulto ter uma atitude assim antes.
Nossa primeira forma de aprender é por imitação, como não temos discernimento simplesmente reproduzimos a ação que vimos. Se em nosso processo de socialização assistimos a um ato preconceituoso em relação a pessoas de etnias diferentes: negros, asiáticos, latinos; homossexuais, deficientes físicos ou mentais, gordos, magros, altos, baixos e outros, afinal qualquer coisa pode ser alvo de preconceito. Após detalhada observação aprendemos a fazer igual ao que assistimos, e ao final não nos lembramos como, quando e onde mas foi assim que aprendemos a ser preconceituosos.
Sabendo disso e detentores de certo discernimento podemos assumir outras posturas e fazer as coisas de modo diferente. Bastando para isso usar um pouco de entendimento do mundo e de auto-observação. Afinal não é porque papai e mamãe ensinaram algo que aquilo é certo ou ainda é útil no mundo contemporâneo. Acredito que com a disponibilização de informação que há hoje temos todas as condições de decidir pensar por nós mesmos e desenvolver nossas próprias opiniões acerca dos mais variados assuntos e deixar de se levar por conceitos e tradições que não tem mais sentido. O difícil é ser, querer e fazer diferente, mas como tudo na vida tudo tem um preço e devemos ter vontade e coragem para pagá-lo.
Avançando em nossa compreensão podemos buscar nos estudos de Bert Hellinger e no processo sistêmico algo que nos dê caminhos para ampliarmos nossa compreensão de como funcionamos.
Segundo Hellinger* estamos submetidos à influencia de três consciências a saber:

A primeira delas, a consciência pessoal, é estreita e tem o seu alcance limitado. Através de sua diferenciação entre o bem e o mal reconhece o pertencer só de alguns e exclui outros.

Como dito acima este limite é dado pelo processo de socialização, é nossa família e relacionamentos próximos que nos dão os parâmetros do que é bom ou mau e fazer a exclusão ou mesmo eliminação do que é considerado inadequado e fora dos padrões aceitos como normais.

A segunda, a consciência coletiva, é mais ampla. Também defende os interesses dos que foram excluídos pela  consciência pessoal. Por isso, está freqüentemente em conflito com a consciência pessoal. Contudo, essa consciência também tem um limite porque abrange somente os membros dos grupos que dependem dela.

Os valores, crenças, formas de ser, sentir, pensar e agir construídos e compartilhados pelo grupo fazem parte desta consciência. Algumas vezes a consciência individual entra em conflito com este nível por falta de entendimento ou mesmo uma interpretação literal e dissociada do jogo da Vida e sua relação com as regras sociais. Mesmo que alguém não aja ou tenha realizado algo que seja contrário ao que é visto como bom, belo e justo esta pessoa pertence ao grupo sendo este: uma família nuclear ou mais extensa, como também a religião, a sociedade e a etnia em que se nasceu. Há vários exemplos que podem servir para entender melhor este processo desde a menina que é expulsa de casa por ter ficado grávida, o irmão doente mental largado no manicômio a própria sorte, o suicida que é esquecido e nunca mais se fala seu nome. Há outros casos semelhantes mas fico com esses mais comuns só para ilustrar como as coisas funcionam. Mesmo que haja exclusão ou mesmo a morte dessas pessoas, o que foram ou fizeram faz parte da história, é uma experiência de vida que não deve ser menosprezada, mas sim integrada ao conjunto familiar e social. Uma vez que caso isso não ocorra, pode ocasionar problemas, pois como um fantasma a energia não integrada age sobre o sistema familiar ou social causando uma série de problemas psíquicos, físicos e outros.

A terceira, a consciência espiritual, supera os limites das outras consciências que colocam limites através da diferenciação entre bom e mau e da diferenciação entre pertencimento e exclusão.

Este nível não precisa de muitas explicações, pelo menos suponho que a maioria das pessoas tem alguma noção do que seja, se bem que há uma série de distorções, má interpretação ou mesmo manipulação pura e simples daqueles que se dizem representantes do divino na Terra. A verdadeira consciência espiritual não impõe limites, é o amor incondicional. Os fatos são aceitos como são, a Vida e suas múltiplas manifestações são integradas e incorporadas ao conhecimento e percepção dos indivíduos e grupos. Seria semelhante às circunstâncias pelas quais passamos e ficamos num clima de pura aceitação daquilo que é, como é, sem julgamentos.
No caso do preconceito com os homossexuais sua origem na maioria dos casos é de cunho moral e religioso, ou seja são antes ideias sem fundamentação no conhecimento desenvolvido recentemente sobre os processos antropo-bio-psíquicos humanos. Quando alguém mostra preconceito acerca deste tema costumo perguntar: O que você conhece sobre a sexualidade humana? Já leu algum livro sobre o assunto? Conversou com algum homossexual para saber como ele/a se sente em relação à sua sexualidade? Conhece como outras culturas, povos e religiões se comportam em relação a essa expressão sexual humana? Na maioria das vezes as pessoas dizem não a todas essas perguntas. Portanto a ignorância acerca de si e das possibilidades de ser  diferente impera.
No Brasil, como em boa parte do mundo, esse preconceito é alimentado principalmente pelas igrejas e seus seguidores e certamente muito poucos dos representantes dessas instituições estão abertos a entrar em contato com saberes, conhecimentos e formas de pensar acerca de qualquer assunto que contradiga aquilo que está em seu mundo dogmático fundamentado no  “livro do profeta”, em especial sobre sexualidade. O que faz com que cada vez mais se afastem do que realmente importa que ao meu ver é a manifestação da própria Vida, aliás o único livro realmente escrito pelo Criador. Como este livro parece estar cheio de assuntos mundanos, sem harmonia e contrários às tradições e dogmas fica muito difícil para algumas instituições modernizar o discurso e se adequar a realidade, que insiste em mostrar que alguns valores estão equivocados. Pelo menos, até onde conheço as propostas do Cristo, não me lembro de ter lido uma linha ou ouvido alguma história na qual ele excluísse qualquer pessoa, sempre acolheu, não julgou ninguém por ser assim ou assado, pelo que fez ou deixou de fazer, muito pelo contrário. Como estava conectado com as forças espirituais, enxergava além do mundano e tinha noção da beleza que se encerra em cada um de nós.
Se queremos nos espiritualizar, tornar-nos mais gente e humanos do que somos, nos aproximar mais de nossa divindade, é preciso fazer um esforço e aplicar a lição: “orai e vigiai”, Orar pedindo lucidez e esclarecimento e vigiar nossos pensamentos e atos e ver se estão de acordo com os propósitos de evolução de nossa consciência. Como dá para observar pelo noticiário e alguns programas de TV, elevar-se, aumentar a compreensão e se transformar em algo melhor passa longe da cabeça de algumas pessoas.
Como já disse em outro texto a alma é imoral, não está presa às convenções sociais, age de acordo com o momento, com o que é possível e interessante para seu desenvolvimento enquanto ser integral. Não há como seguir um script, quando privilegiamos o script na maioria das vezes nos magoamos e estamos mais distantes de nossa conexão com nossa divindade.
São realizadas muitas campanhas para diminuir ou acabar com a violência, de alguma maneira são efetivas, mas poderiam ter maior alcance se além de se preocupar em aumentar a vigilância, a repressão e punição de tais atos fosse também realizado um programa de educação, no qual fossem ensinados o entendimento e respeito a diversidade humana em todas suas manifestações. Quem sabe com isso consigamos ter uma sociedade mais justa, ética e harmônica, usando de processos inteligentes e mais eficazes de lidar consigo e com o outro, com menos ilusões e conceitos equivocados de separação, afinal até prova em contrário somos todos irmãos, cientificamente falando, pois todos nós possuímos o mesmo DNA e pertencemos a uma única espécie.


18/07/2010

Jogo do Despertar

Jogo do Despertar
Santiago Torrente Perez


Imagino que a consciência possa ter prevalecido na evolução porque conhecer os sentimentos causados pelas emoções era absolutamente indispensável para a arte de viver, e porque a arte de viver foi um tremendo sucesso na história da natureza. Mas não me incomodarei se você preferir deturpar minhas palavras e disser apenas que a consciência foi inventada para que pudéssemos tomar conhecimento da vida. Obviamente, do ponto de vista científico o fraseado não e correto mas eu gosto dele. (António Damásio)

Vamos discutir um pouco o que seja a consciência e o processo de desenvolvimento de autoconsciência. Todo e qualquer organismo para agir no mundo e suprir suas necessidades de alimentação, abrigo, reprodução se vale dos mecanismos da consciência para se direcionar no ambiente em que vive e alcançar os objetivos que satisfaçam seus desejos, sendo que a referência que cada organismo usa para em suas ações é ele próprio.

Como as demais coisas da natureza a consciência também evolui, basta ver como se deu esse processo na humanidade, de uma espécie semelhante aos chimpanzés que, como os atuais viviam em grupo e, faziam alguns artefatos para facilitar algumas de suas atividades relacionadas a alimentação e defesa foi-se desenvolvendo, fazendo surgir seres cada vez mais complexos devido ao desenvolvimento do cérebro, ao aumento das capacidades de memória e raciocínio, ao desenvolvimento de capacidades motoras mais elaboradas e a articulação da linguagem, capacidade que entre outras coisas, nos possibilita comunicar e transmitir o conhecimento adquirido às gerações futuras, nos tornamos humanos. Entre todos os animais vivos o ser humano é o único capaz de saber, saber que sabe e de poder transmitir isso aos mais jovens.

Este processo levou milhares de anos e agora conforme avança nosso conhecimento dos fenômenos da natureza e das leis físicas, químicas e biológicas que regem o desenvolvimento da vida, podemos aprofundar e compreender melhor nossos vínculos a universos cada vez mais amplos Mas infelizmente as novas noções adquiridas com o desenrolar do aprendizado acumulado durante milhares de anos não corresponderam a uma maior compreensão de quem somos ou o que fazemos aqui. O Homo sapiens chegou ao século XXI com um fabuloso arsenal tecno-científico que facilita sua vida em diversos sentidos mas graças a isso está se tornando num ser mecanizado, automatizado. Como dizem alguns espertos: a maioria dos homens está dormindo, ainda não despertou para a verdade.

Em todas as sociedades e culturas existiram xamãs, sacerdotes, filósofos, profetas, místicos que tinham um conhecimento mais elaborado a respeito do funcionamento do cosmos e procuravam transmitir o que sabiam para um grupo reservado de iniciados. Suas lições davam conta de explicar o mundo de forma mais abrangente do que aquela que há nas aparências das coisas. Cada um à sua maneira procurava esclarecer e passar o que sabia aos seus contemporâneos, mas muito do que sabiam não era divulgado por diversas razões, que iam do medo de revelar segredos “perigosos” aos mais mesquinhos como manter a maioria na ignorância.

Atualmente muito do que era dito pelos antigos está sendo comprovado pela física contemporânea e por alguns biólogos. A física nos elucidou a verdadeira natureza da matéria que nada mais é do que energia e, além disso, está tentando comprovar que tudo o que existe faz parte de um grande campo chamado de “campo unificado, que nada mais é que o princípio primeiro de tudo que existe no universo. como dizem os indianos é o local onde o não manifesto dá origem ao manifesto. Por seu lado a biologia está realizando pesquisas que demonstram que o privilegio da consciência não é somente do ser humano ou dos animais superiores mas é um fenômeno que ocorre também em outros reinos animas. Alguns pesquisadores vão ainda mais longe afirmando que inclusive as partículas elementares da matéria tem algo de consciência, como nos diz o físico Amit Goswami: O universo é autoconsciente através de nós. Em nós, o universo divide-se em dois – em sujeito e objeto. (O Universo Autoconsciente) , porque segundo tenta demonstrar em seu livro toda a matéria do universo age de forma ordenada e parece ter um comportamento consciente.

Sujeito-Objeto um bom começo


Pegando como sugestão essa divisão sujeito-objeto pela qual temos pautado nosso comportamento há milhares de anos temos que ter claro que não se limita somente a relação que temos com o mundo mas também com nós mesmos e neste ponto podemos dar início à discussão sobre o processo de desenvolvimento de nossa consciência enquanto um ser transpessoal.

É através do mundo dualizado que a consciência pode se desenvolver, e pelo contraste entre os opostos nos seja possível tomar conhecimento das diversas manifestações de matéria e vida, sentimentos e energias pulsantes em nosso universo.

Levamos longe demais a objetivação do mundo, pusemos o mundo tão fora e num nível superior a nós que nos perdemos ao longo do caminho e o processo de retorno à nossa verdade interior é doloroso, porque temos que deixar um grande número de valores aprendidos em nosso processo evolutivo pessoal que pouco ou nada tem a ver com as sensações, com a verdade inerente a cada um de nós. Além de romper laços energéticos criados e alimentados durante vários anos, não só ao nível pessoal-familiar mas em outros, temos que romper padrões de pensamento e comportamentais que fazem parte do sistema no qual estamos vivendo.

Em nossa fase atual de evolução e conhecimento de acordo as mais modernas pesquisas na neuro-fisiologia, psicologia e antropologia, podemos concluir que somos todos indivíduos, conscientes, auto-referentes, capazes de escolha e responsáveis pelo que escolhemos. Explicando isso melhor:

Indivíduos – como a própria palavra diz: “não divididos em dois” ou seja somos um ser único, não há, nunca houve ou haverá alguém igual a nós em todo o Universo.

Conscientes – temos uma mente que nos capacita a conhecer e perceber a nós mesmos e a realidade que nos cerca.

Auto-referentes – a referência para nossas ações, atitudes e comportamento são nossas sensações, sentimentos e pensamentos, o meio pelo qual isso é melhor percebido está no processo bioenergético de nosso corpo.

Escolhas – como vivemos num mundo de contrastes somos submetidos a todo momento de nossa vida a escolher aquilo que desejamos fazer a cada instante, baseados em nossas sensações, sentimentos e pensamentos.

Responsáveis – cada escolha realizada acarreta uma série de consequências que podem ser positivas ou negativas a nós. Responsabilidade é nossa habilidade de criar respostas que dependendo de nossas escolhas podem ser favoráveis ou não ao nosso desenvolvimento.

Mas o indivíduo para chegar a realizar todo o potencial inato de humanidade,  precisa passar por um processo de socialização, e neste período de sua vida aprende valores referentes à cultura onde nasce que põe sob véus sua verdadeira natureza. Pelo menos nas sociedades ocidentais somos educados de forma a dar mais importância ao mundo externo, a opinião dos outros, colocamos nossas referências no mundo ao invés de em nós mesmos.

Essa inversão de valores traz consequências horríveis para nosso sistema, pois causa tensões musculares em todo o corpo, formando couraças energéticas que vão impedindo o fluxo livre de nossos sentimentos, causando modificações físicas pelas quais um olho treinado pode perceber qual o tipo de desorientação pela qual o indivíduo está passando. Além do que ocorre ao nível físico temos uma série de repercussões em níveis mais sutis de nosso ser como nos corpos emocional, mental e astral. Como um ser energético qualquer atitude negativa atinge primeiro os níveis mais sutis de nosso ser, que por um mecanismo de defesa vai enviando sinais de alerta através do corpo para que percebamos o que não nos serve mais e mudemos de atitude.

Iniciando a romper os véus


No processo do despertar deve-se buscar reconhecer e aceitar nossa verdade que na maioria das vezes é diferente daquela forma ideal aprendida e exigida pela sociedade. Somos educados equivocadamente desde o início pois só seremos alguém quando crescermos, chegamos ao mundo adulto sem saber exatamente o que seja “ser alguém. Também aprendemos desde cedo um jogo perverso de manipulação que nos tira a integridade, subvertemos nossos sentimentos e emoções em função daquilo que desejamos que os outros façam por nós ou aquilo que queremos que eles pensem a nosso respeito – não podemos nos mostrar como somos, pois há a ilusão de que perderemos a amizade, confiança ou afinidade – para conseguir reconhecimento, atenção e carinho nos deixamos cair na tentação de sermos algo que não somos.

Deixar de lado as crenças e comportamentos automatizados pode ser no início trabalhoso e dolorido, mas conforme vai-se evoluindo se percebe que as nuvens começam a se dissipar e começamos a ver as coisas com mais clareza. Temos que aprender a nos orientar a perceber nossas sensações, deixá-las fluir, aprender a discernir o que elas significam e quais as crenças pelas quais estão sendo moldadas para se necessário modificá-las, caso percebamos que não servem mais para nosso atual estágio de desenvolvimento.

Esse processo de auto-atualização deve ser realizado constantemente, ficando atentos às nossas sensações e como elas atuam em nosso corpo e como fluem através dele durante nossa vida cotidiana para que possamos desenvolver uma ligação consciente com essas sensações que provêm de nosso ser interior e discernir quando estamos agindo de acordo com o que sentimos e quando não. E percebendo que estamos fugindo de nossas emoções devemos procurar descobrir quais as razões que nos levaram a agir daquele modo.

Como disse anteriormente as razões que levam alguém a agir contra seu Ser são construídas no decorrer de seu desenvolvimento no interior da sociedade, e sendo assim o indivíduo deve ser levado a perceber quais das razões impostas pela educação que recebeu lhe servem ou podem ser deixadas de lado. Este é um processo em que temos que deixar claro o que é interno e o que é externo. Quais as forças nas quais o indivíduo dará mais atenção se as que vão realizá-lo ou as que vão colocá-lo a serviço do mundo.

Todos somos perfeitos, o universo não cria nada que não seja perfeito em si mesmo, nós como a parte consciente dele temos todas as ferramentas necessárias ao nosso pleno desenvolvimento enquanto um ser inteiro, integro. Cabe a cada um de nós perceber essas habilidades inatas e desenvolvê-las da melhor maneira possível. A vida é a grande mestra pois a cada nova fase da existência nos são colocadas novas lições, que nos permitem aprender aquilo que será necessária para cada fase de nosso crescimento.

Como diz Caetano – Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é" – e só há uma maneira de descobrir, mergulhando em si, observando em seu cotidiano quais as sensações que percorrem o corpo em cada momento e como elas são decodificadas pela mente. É neste momento, que dura alguns segundos que pode-se fazer a grande magia de transformação, de crescimento. É neste momento que nossa consciência tem condições de verificar qual programação está ativa, qual sua origem, quais as vozes que lhe dão força e se está de acordo com o nível de consciência vivido naquele momento.

Todos somos diferentes pois cada um é uma manifestação única do Um mas em princípio somos todos iguais. Mas para chegar a este entendimento passamos por situações semelhantes de sofrimento e dor que vão destruindo nossas ilusões e nos mostrando a verdade de nossa unicidade. As desgraças pelas quais passamos não são necessários mas foi a forma que escolhemos para evoluir, a partir da evolução de nossa consciência nossa escolha pode ser diferente, basta fortalecer a re-ligação com nossa alma e deixar que ela nos guie.

O jogo de se encontrar é interminável e gratificante, despertar esse desejo do encontro consigo mesmo é uma chama que quando acessa nunca mais se apaga.  Convido você a entrar no jogo. Então, quando vai começar?

 

28/06/2010

Consciência e Espiritualidade

Consciência e Espiritualidade
Santiago Torrente Perez




                              "Religião é a crença na experiência de alguém, Espiritualidade e ter sua própria experiência."
Deepak Chopra
Em qualquer curso que inicio faço uma retrospectiva acerca do desenvolvimento do conhecimento humano, acho importante saber que chegamos até aqui graças ao esforço de bilhões de seres, que antes de nós bem ou mal, acertando e errando, foram construindo o que temos hoje e ao chegar no conhecimento religioso abro um parenteses para esclarecer alguns pontos, pois como digo: “uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”.  Então temos que: Espiritualidade, Religião e Igreja, são coisas completamente distintas e autônomas uma em relação a outra. Vejamos algumas características de cada uma delas:

- Espiritualidade é algo inerente ao todo cósmico, transcendente, imanente, impessoal, não pode ser visto ou tocado, é imutável e eterno.


- Religião é o que cada cultura ou grupo desenvolve como explicação aos fenômenos do existir, calcada na intuição e crenças em entes transcendentes, descreve formas de contato com o que acredita ser espiritual através de rituais, comportamentos morais, tabus e outras normas. Tem data de nascimento e morte. Sua morte ocorre quando morre o último representante de uma cultura ou do seu mais ardente fiel. Atualmente existem milhares espalhadas pelos quatro continentes, segundo pesquisas são criadas e desaparecem mais ou menos 3000 por ano. 


- Igreja ou templo é o lugar designado pela religião de cada cultura ou grupo onde devem ser realizados os rituais individuais ou coletivos para contato com o que é chamado de espiritual: deuses, orixás, santos e outros. É o lugar onde se fazem as oferendas e demais atividades que supostamente colocam o crente mais próximo à divindade, pode ser: uma igreja, sinagoga, terreiro, na mata, na praia ou qualquer outro espaço desde que esteja de acordo com os cânones propostos pelo código religioso.


Esse discernimento é necessário para iniciarmos um estudo sério acerca do seja cada um desses aspectos ligados a esse assunto. Como é algo polêmico, sempre sugiro que antes se tome uma atitude de suspender por algum tempo nossas crenças, valores e nos permitir ler, ouvir e entender o que outras pessoas tem a dizer sobre isso. Se nos fechamos perdemos a oportunidade de entender e compreender algo melhor e seguir adiante em nossa evolução. 


Temos que ter consciência que entre o que é real e o que acreditamos ser esse real há um espaço que é preenchido com nossas interpretações, ou seja um mundo simbólico que nem sempre é fiel ao que seja o real. Como se trata do universo das ideias que temos do mundo, esse lugar está cheio de erros e ilusões, em primeiro lugar porque como dependemos de nossos sentidos para conhecer a realidade devemos ter claro que eles têm seus limites, captam somente aquilo que nosso cérebro é capaz de processar, deixando de lado uma enorme quantidade de informação por considerá-la desnecessária. As ilusões por sua vez se originam dessas interpretações, estão vinculadas as nossas emoções nos fazendo ver algo que não é verdadeiro como se fosse. Tanto os erros como as ilusões só podem ser suplantados por um esforço consciente pelo qual através do uso de nossa racionalidade nos acercamos mais do que seja verdade.


Um dos aspectos dessa realidade é que cada um de nós pertence, enquanto indivíduo, a uma sociedade na qual somos socializados e incorporamos seus valores, crenças e modos de ser, sentir, agir e pensar e além disso pertencemos também a uma única espécie que graças a sua criatividade criou milhares de culturas, cada uma com suas peculiaridades. Esta noção deveria ampliar o discernimento acerca de nós e de como lidamos com as situações, mas na maioria do tempo nos esquecemos desse nosso pertencimento há algo maior do que nossa rotina nos leva a crer.


No campo que estamos explorando aqui há muito que se trabalhar no sentido de melhor entender o que seja espiritualidade e como podemos fazer para integrar esse aspecto em nosso cotidiano. 


Todas as religiões pregam o amor incondicional ou ágape mas o resultado que podemos ver é quase sempre seu oposto, quando alguém se identifica com algum culto na maioria das vezes age como somente merecesse respeito ou atenção alguém que compartilha das mesmas crenças que as suas, os demais são vistos como desgarrados ou infiéis. Isso no mínimo devia ser encarado com estranheza uma vez que todas as religiões procuram explicar a mesma coisa ou seja a espiritualidade, obviamente cada uma a sua maneira, sendo cada uma delas, na realidade, uma faceta do diamante que decompõe a luz divina. 


Nessa vivência física, como já dito acima, somos conformados por três aspectos diferentes do ser: o da individualidade, o da sociedade e o da espécie, sendo que podemos relacioná-los às três consciências propostas por Bert Hellinger: a consciência individual, a do grupo e a consciência espiritual. Segundo ele a consciência individual é a mais limitada, presa a dualidade Bem-Mal, aceita alguns e exclui outros, a do grupo é um pouco mais ampla em virtude das necessidades de sobreviver e manter sua integridade não exclui, mas abrange apenas os membros vinculados ao grupo, já na consciência espiritual  não há diferenciação entre Bem e Mal e entre quem pertence ou não, afinal todos os indivíduos fazem parte dela.


Alcançar esse tipo de compreensão passa obviamente por um processo de reeducação de nossa personalidade, visando a sua atualização ao nosso atual estágio de evolução tanto individual como coletivo. Não é um processo fácil, já que temos que fazer um esforço para nos desidentificarmos de algumas coisas e nos permitir abrir para outras possíveis alternativas de ser, ou seja buscar ampliar o grau dessa identificação com algo mais abrangente do que nossa consciência ordinária. 


Pensando na frase de Deepak Chopra que abre este artigo, que sugere que a espiritualidade é uma experiência pessoal deveríamos rever nossas crenças e práticas ao restabelecer nosso contato com o que nos torna seres espirituais tendo uma vivência humana. Todas as religiões desenvolveram e buscam transmitir técnicas de contato com esse aspecto ampliado de nosso ser, por exemplo: os diversos rituais de cunho religioso, danças ritualísticas, meditação, oração entre outras que podem ser feitas individual ou coletivamente.


Devemos ter atenção quando praticamos qualquer uma dessas técnicas e verificar como as praticamos. Muitas vezes fazemos esses rituais de forma mecânica, como uma obrigação diária ou semanal, como se estivéssemos conversando com algo fora de nós. A imagem que pode representar isso é a de uma criança mostrando a um adulto como é obediente esperando receber atenção e retribuições, certamente espiritualidade não é isso, já que não há nada nem ninguém fora nos avaliando. A única coisa ou ser que pode estar realizando algum tipo de avaliação e a parte de nós que se conecta ao todo, à fonte de tudo, nossa parte divina enfim. 


Quando realizadas com a devida atenção, essas técnicas apresentam algum tipo de resultado, ou seja devem repercutir em nosso ser e mostrar sua funcionalidade,  por outro lado cabe a nós estarmos atentos em que nível isso acontece: coincidências, sincronicidades, se mudamos algo em nossa personalidade no processo de nos relacionarmos com os outros, se estamos mais equilibrados emocionalmente, se estamos mais saudáveis entre várias outras coisas. O contato espiritual de alguma maneira tem que ser percebido pela consciência, para que seja aumentada nossa fé e confiança no invisível, não de forma supersticiosa, mas fundamentada numa experiência vivida em nossa realidade. 


Quanto mais ampliamos o contato com essa nossa parte interior mais nos conectamos aos aspectos mais elevados do ser, saindo do mundano e nos aproximando do divino. Ao irmos alcançando este discernimento mais percebemos que nossa alma não se apega a nada, é livre, faz o que é certo a cada momento, não se importando se é bom ou mau aos olhos dos demais, por isso ela trai como diz Nilton Bonder em seu livro “Alma Imoral”, pois ela transcende a moral, a lei e normas de conduta humanos. 


Quando nos abrimos a essa postura começamos a entender melhor o processo Vida e as múltiplas influências que existem no tempo e no espaço. Vemos o quanto ela é criativa, nos surpreendendo a cada instante. Ficamos abertos ao mundo e suas belezas, mesmo que em princípio achemos feio, desagradável ou algo semelhante. Não existe mal nem bem, na amplitude e unidade cósmica existe apenas o funcional. Essa também é uma noção que nos ajuda a sair da dualidade e procurar entender as situações a partir de outra perspectiva.




24/12/2009

Papel Social e Autoconsciência

Papel Social e Autoconsciência

Santiago Torrente Perez

Todos nós, para viver em sociedade, aprendemos desde pequenos que para sermos membros do grupo que nascemos e com o qual vamos conviver temos que nos comportar de determinada maneira. Nos são ensinados as normas, regras, valores, formas de ser, sentir, agir e pensar do grupo ao qual pertencemos, a isso se chama socialização.
A partir de um processo de identificações e desindentificações vamos construindo nossa personalidade, nos servindo das possibilidades apresentadas e aceitas como comportamentos adequados socialmente, assumindo papeis como: os de filho(a), pai, mãe, marido, esposa, avô, avó, empregado(a), amigo(a) e muitos outros.
Mas muitas vezes ao fazermos essa adaptação vamos nos distanciando cada vez mais de nossos impulsos e necessidades internas ocasionando uma série de problemas psíquicos e emocionais.
Nossos impulsos básicos são cinco: sexualidade, curiosidade, habilidade, domínio é presença. Em cada um de nós eles se apresentam com cargas energéticas diferentes, conformando nosso temperamento, uns sensuais, outros inquiridores, artísticos, líderes, carismáticos, ou uma mistura de tudo isso.
Conforme o momento evolutivo de cada um, o processo chamado Vida vai proporcionando situações onde estes impulsos vão sendo desenvolvidos, dando a cada um suas características peculiares. Mas há situações em que a plena manifestação natural do impulso é vista de forma inadequada pela cultura onde nascemos ou tem sua plena manifestação interrompida por qualquer motivo. Sendo ai que podem surgir os problemas, pois o bloqueio à livre manifestação dos impulsos faz com eles sejam reprimidos indo se represar no inconsciente, de onde podem vir a atuar em sua forma negativa ou pervertida.
Para exemplificar podemos falar do primeiro impulso mencionado: a sexualidade. Bastante conhecido e popularizado pela discussão acerca da teoria de Freud. Está diretamente ligado à criatividade do ser, associado a sensualidade possibilita o desenvolvimento das relações afetivas entre as pessoas. Há diversos exemplos do que este impulso mal desenvolvido pode causar de transtornos emocionais e comportamentais nos indivíduos: inadequação nos relacionamentos íntimos podendo ocasionar situações de violência como estupros, pedofilia entre outros.
Todos os impulsos tem seu lado negativo, não vou detalhar um a um aqui, entro em mais detalhes em cursos e palestras.
Como dito em algum lugar não podemos servir a dois senhores, ou seja, se por um lado temos que viver em sociedade e assumir suas normas e regras como nossas para sermos aceitos pelo grupo de outro temos que nos permitir expressar na medida do possível de maneira espontânea e livre nossa parte divina, nosso self como diz Jung. Algo que não é fácil, pois cada grupo tem estabelecido o que é bom ou mau, aceito ou não. De qualquer maneira depois de várias experiências, frustrações e abertura a outras possibilidades de ser, sentir, agir e pensar podemos descobrir caminhos que nos permitam suplantar essa divisão entre a personalidade que assumimos e o ser interno que quer se manifestar.
É preciso ter coragem e firmeza para enfrentar olhares, críticas e o possível afastamento de pessoas queridas. Isso faz parte de nossa aprendizagem enquanto espíritos vivendo na condição humana.
O mundo contemporâneo permite a cada pessoa que conseguiu manter algum grau de consciência de si, e tem uma certa inquietação e necessidade de buscar seu próprio caminho, encontrar numa infinidade de possibilidades meios de manifestar seus impulsos criativos nos mais diversos campos da atividade humana, sejam eles: religiosos, artísticos, modos de vestir, estilos musicais, políticos e outros onde possa fazer emergir a espontaneidade da livre expressão do seu self. Podemos experimentar onde nosso ser interno melhor se adapta e simplesmente nos deixar ser. Nossa época é maravilhosa nesse sentido, podemos enfim buscar nosso processo de individuação, encontrar a nós mesmos ao mesmo tempo que encontramos os demais em nós. Afinal querendo ou não estamos todos conectados de uma maneira que ainda nem sequer começamos a compreender.
Essas conexões são extremamente complexas, em primeiro lugar com nossa origem familiar, em seguida ao contexto histórico vivido pessoal e coletivamente e por fim a maneira como todos esses processos influenciam na construção do cenário que junto aos outros personagens que cruzarão nosso caminho nos levarão a passar por uma série de situações em nossa história de vida com suas alegrias tristezas, amarguras, desventuras, aventuras, felicidade e êxtase que servirão para que a personalidade aprendida socialmente possa ir se modificando, se adaptando às necessidades de nosso ser interno dando-lhe a chance de se desenvolver e desabrochar.
Costumo dizer que estamos mergulhados num grande continuum, onde tudo está ligado. No universo não há fios soltos, acasos e acidentes. Nosso self se conecta com nosso corpo, que se conecta com nossa origem que se conecta ao nosso processo histórico e social e assim por diante numa interminável cadeia. Não somos somente fruto de uma carga genética ou hábitos culturais há muito mais, existe toda uma bagagem energética que precisa ser vista e analisada. De alguma maneira estamos todos conectados por elos invisíveis muito bem demonstrado pelas Constelações Familiares.
A partir do entendimento de como nós nos encaixamos dentro desse gigantesco e maravilhoso encadeamento podemos iniciar a compreender cada fase de crescimento pela qual passamos e a necessidade de nos adaptar a cada ampliação de limites que elas nos proporcionam ao longo da vida. Saímos do útero materno e chegamos no grupo familiar, vamos para escola, entramos no mundo do trabalho e criamos uma nova família. Todos eles representam desafios e oportunidades de desenvolvimento. Cada um determina formas, modelos e limites, diferentes e mais abrangentes cabe a nos a partir de nosso nível consciencial nos atualizar e ajustar nossa personalidade a fim de que possa permitir que nosso self encontre o caminho de assumir plenamente as possibilidades de cada novo limite, para isso este deve ser vivido até a exaustão para que possamos descobrir quais as maneiras mais confortáveis, as que nos fazem sentir livres, bem ou não, sendo que ao percebemos que tocamos em algo como limitante e inadequado nos faça seguir adiante levando-nos a buscar o próximo passo, forma, limite o qual seja mais adequado ao nosso processo atual.
Na medida do possível devemos tomar consciência de que do mesmo jeito que atores podemos vestir e desvestir os personagens/papeis que aprendemos, nos dando a chance de expressarmos o que nosso ser interno deseja ser expresso, seja um gesto de afeto e carinho, uma ação bondosa ou um arrebato de ira, desde que essas atitudes estejam calcadas em algo sentido, originado por uma necessidade genuína de manifestação de algum de nossos impulsos e não apenas em algo aprendido e reproduzido inconscientemente, como os papeis incorporados através de nossa educação. De qualquer maneira já fazemos isso constantemente, sem percebermos, mas se nos dispormos a dar um passo atrás e começarmos a perceber e analisar como vestimos e saímos dos diversos papeis podemos entender como se dá o encadeamento das diversas fases pelas quais passamos, buscar levar nossa vida mais presente e consciente assumindo a atitude mais correta a cada momento, sendo mais coerentes ao que estamos sentindo do que ao que estamos pensando que seja mais adequado.
De alguma forma com o conhecimento acumulado atualmente estamos começando a nos dar conta desse processo de forma mais integral e consciente, iniciamos a perceber como uma pequena atitude afeta nossas relações com os outros, o meio ambiente, o planeta e o cosmos, o que certamente nos permitirá em algum momento a cada um de nós assumir sua divindade e ser capaz de enfrentar “o mundo” e dizer: “olha eu sou assim e faço diferente, mas continuo fazendo parte da humanidade e de todo o resto” e agindo assim permitir que cada um manifeste sua maneira de ser uma das muitas faces de Deus.