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24/12/2009

Papel Social e Autoconsciência

Papel Social e Autoconsciência

Santiago Torrente Perez

Todos nós, para viver em sociedade, aprendemos desde pequenos que para sermos membros do grupo que nascemos e com o qual vamos conviver temos que nos comportar de determinada maneira. Nos são ensinados as normas, regras, valores, formas de ser, sentir, agir e pensar do grupo ao qual pertencemos, a isso se chama socialização.
A partir de um processo de identificações e desindentificações vamos construindo nossa personalidade, nos servindo das possibilidades apresentadas e aceitas como comportamentos adequados socialmente, assumindo papeis como: os de filho(a), pai, mãe, marido, esposa, avô, avó, empregado(a), amigo(a) e muitos outros.
Mas muitas vezes ao fazermos essa adaptação vamos nos distanciando cada vez mais de nossos impulsos e necessidades internas ocasionando uma série de problemas psíquicos e emocionais.
Nossos impulsos básicos são cinco: sexualidade, curiosidade, habilidade, domínio é presença. Em cada um de nós eles se apresentam com cargas energéticas diferentes, conformando nosso temperamento, uns sensuais, outros inquiridores, artísticos, líderes, carismáticos, ou uma mistura de tudo isso.
Conforme o momento evolutivo de cada um, o processo chamado Vida vai proporcionando situações onde estes impulsos vão sendo desenvolvidos, dando a cada um suas características peculiares. Mas há situações em que a plena manifestação natural do impulso é vista de forma inadequada pela cultura onde nascemos ou tem sua plena manifestação interrompida por qualquer motivo. Sendo ai que podem surgir os problemas, pois o bloqueio à livre manifestação dos impulsos faz com eles sejam reprimidos indo se represar no inconsciente, de onde podem vir a atuar em sua forma negativa ou pervertida.
Para exemplificar podemos falar do primeiro impulso mencionado: a sexualidade. Bastante conhecido e popularizado pela discussão acerca da teoria de Freud. Está diretamente ligado à criatividade do ser, associado a sensualidade possibilita o desenvolvimento das relações afetivas entre as pessoas. Há diversos exemplos do que este impulso mal desenvolvido pode causar de transtornos emocionais e comportamentais nos indivíduos: inadequação nos relacionamentos íntimos podendo ocasionar situações de violência como estupros, pedofilia entre outros.
Todos os impulsos tem seu lado negativo, não vou detalhar um a um aqui, entro em mais detalhes em cursos e palestras.
Como dito em algum lugar não podemos servir a dois senhores, ou seja, se por um lado temos que viver em sociedade e assumir suas normas e regras como nossas para sermos aceitos pelo grupo de outro temos que nos permitir expressar na medida do possível de maneira espontânea e livre nossa parte divina, nosso self como diz Jung. Algo que não é fácil, pois cada grupo tem estabelecido o que é bom ou mau, aceito ou não. De qualquer maneira depois de várias experiências, frustrações e abertura a outras possibilidades de ser, sentir, agir e pensar podemos descobrir caminhos que nos permitam suplantar essa divisão entre a personalidade que assumimos e o ser interno que quer se manifestar.
É preciso ter coragem e firmeza para enfrentar olhares, críticas e o possível afastamento de pessoas queridas. Isso faz parte de nossa aprendizagem enquanto espíritos vivendo na condição humana.
O mundo contemporâneo permite a cada pessoa que conseguiu manter algum grau de consciência de si, e tem uma certa inquietação e necessidade de buscar seu próprio caminho, encontrar numa infinidade de possibilidades meios de manifestar seus impulsos criativos nos mais diversos campos da atividade humana, sejam eles: religiosos, artísticos, modos de vestir, estilos musicais, políticos e outros onde possa fazer emergir a espontaneidade da livre expressão do seu self. Podemos experimentar onde nosso ser interno melhor se adapta e simplesmente nos deixar ser. Nossa época é maravilhosa nesse sentido, podemos enfim buscar nosso processo de individuação, encontrar a nós mesmos ao mesmo tempo que encontramos os demais em nós. Afinal querendo ou não estamos todos conectados de uma maneira que ainda nem sequer começamos a compreender.
Essas conexões são extremamente complexas, em primeiro lugar com nossa origem familiar, em seguida ao contexto histórico vivido pessoal e coletivamente e por fim a maneira como todos esses processos influenciam na construção do cenário que junto aos outros personagens que cruzarão nosso caminho nos levarão a passar por uma série de situações em nossa história de vida com suas alegrias tristezas, amarguras, desventuras, aventuras, felicidade e êxtase que servirão para que a personalidade aprendida socialmente possa ir se modificando, se adaptando às necessidades de nosso ser interno dando-lhe a chance de se desenvolver e desabrochar.
Costumo dizer que estamos mergulhados num grande continuum, onde tudo está ligado. No universo não há fios soltos, acasos e acidentes. Nosso self se conecta com nosso corpo, que se conecta com nossa origem que se conecta ao nosso processo histórico e social e assim por diante numa interminável cadeia. Não somos somente fruto de uma carga genética ou hábitos culturais há muito mais, existe toda uma bagagem energética que precisa ser vista e analisada. De alguma maneira estamos todos conectados por elos invisíveis muito bem demonstrado pelas Constelações Familiares.
A partir do entendimento de como nós nos encaixamos dentro desse gigantesco e maravilhoso encadeamento podemos iniciar a compreender cada fase de crescimento pela qual passamos e a necessidade de nos adaptar a cada ampliação de limites que elas nos proporcionam ao longo da vida. Saímos do útero materno e chegamos no grupo familiar, vamos para escola, entramos no mundo do trabalho e criamos uma nova família. Todos eles representam desafios e oportunidades de desenvolvimento. Cada um determina formas, modelos e limites, diferentes e mais abrangentes cabe a nos a partir de nosso nível consciencial nos atualizar e ajustar nossa personalidade a fim de que possa permitir que nosso self encontre o caminho de assumir plenamente as possibilidades de cada novo limite, para isso este deve ser vivido até a exaustão para que possamos descobrir quais as maneiras mais confortáveis, as que nos fazem sentir livres, bem ou não, sendo que ao percebemos que tocamos em algo como limitante e inadequado nos faça seguir adiante levando-nos a buscar o próximo passo, forma, limite o qual seja mais adequado ao nosso processo atual.
Na medida do possível devemos tomar consciência de que do mesmo jeito que atores podemos vestir e desvestir os personagens/papeis que aprendemos, nos dando a chance de expressarmos o que nosso ser interno deseja ser expresso, seja um gesto de afeto e carinho, uma ação bondosa ou um arrebato de ira, desde que essas atitudes estejam calcadas em algo sentido, originado por uma necessidade genuína de manifestação de algum de nossos impulsos e não apenas em algo aprendido e reproduzido inconscientemente, como os papeis incorporados através de nossa educação. De qualquer maneira já fazemos isso constantemente, sem percebermos, mas se nos dispormos a dar um passo atrás e começarmos a perceber e analisar como vestimos e saímos dos diversos papeis podemos entender como se dá o encadeamento das diversas fases pelas quais passamos, buscar levar nossa vida mais presente e consciente assumindo a atitude mais correta a cada momento, sendo mais coerentes ao que estamos sentindo do que ao que estamos pensando que seja mais adequado.
De alguma forma com o conhecimento acumulado atualmente estamos começando a nos dar conta desse processo de forma mais integral e consciente, iniciamos a perceber como uma pequena atitude afeta nossas relações com os outros, o meio ambiente, o planeta e o cosmos, o que certamente nos permitirá em algum momento a cada um de nós assumir sua divindade e ser capaz de enfrentar “o mundo” e dizer: “olha eu sou assim e faço diferente, mas continuo fazendo parte da humanidade e de todo o resto” e agindo assim permitir que cada um manifeste sua maneira de ser uma das muitas faces de Deus.


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