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28/06/2010

Consciência e Espiritualidade

Consciência e Espiritualidade
Santiago Torrente Perez




                              "Religião é a crença na experiência de alguém, Espiritualidade e ter sua própria experiência."
Deepak Chopra
Em qualquer curso que inicio faço uma retrospectiva acerca do desenvolvimento do conhecimento humano, acho importante saber que chegamos até aqui graças ao esforço de bilhões de seres, que antes de nós bem ou mal, acertando e errando, foram construindo o que temos hoje e ao chegar no conhecimento religioso abro um parenteses para esclarecer alguns pontos, pois como digo: “uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”.  Então temos que: Espiritualidade, Religião e Igreja, são coisas completamente distintas e autônomas uma em relação a outra. Vejamos algumas características de cada uma delas:

- Espiritualidade é algo inerente ao todo cósmico, transcendente, imanente, impessoal, não pode ser visto ou tocado, é imutável e eterno.


- Religião é o que cada cultura ou grupo desenvolve como explicação aos fenômenos do existir, calcada na intuição e crenças em entes transcendentes, descreve formas de contato com o que acredita ser espiritual através de rituais, comportamentos morais, tabus e outras normas. Tem data de nascimento e morte. Sua morte ocorre quando morre o último representante de uma cultura ou do seu mais ardente fiel. Atualmente existem milhares espalhadas pelos quatro continentes, segundo pesquisas são criadas e desaparecem mais ou menos 3000 por ano. 


- Igreja ou templo é o lugar designado pela religião de cada cultura ou grupo onde devem ser realizados os rituais individuais ou coletivos para contato com o que é chamado de espiritual: deuses, orixás, santos e outros. É o lugar onde se fazem as oferendas e demais atividades que supostamente colocam o crente mais próximo à divindade, pode ser: uma igreja, sinagoga, terreiro, na mata, na praia ou qualquer outro espaço desde que esteja de acordo com os cânones propostos pelo código religioso.


Esse discernimento é necessário para iniciarmos um estudo sério acerca do seja cada um desses aspectos ligados a esse assunto. Como é algo polêmico, sempre sugiro que antes se tome uma atitude de suspender por algum tempo nossas crenças, valores e nos permitir ler, ouvir e entender o que outras pessoas tem a dizer sobre isso. Se nos fechamos perdemos a oportunidade de entender e compreender algo melhor e seguir adiante em nossa evolução. 


Temos que ter consciência que entre o que é real e o que acreditamos ser esse real há um espaço que é preenchido com nossas interpretações, ou seja um mundo simbólico que nem sempre é fiel ao que seja o real. Como se trata do universo das ideias que temos do mundo, esse lugar está cheio de erros e ilusões, em primeiro lugar porque como dependemos de nossos sentidos para conhecer a realidade devemos ter claro que eles têm seus limites, captam somente aquilo que nosso cérebro é capaz de processar, deixando de lado uma enorme quantidade de informação por considerá-la desnecessária. As ilusões por sua vez se originam dessas interpretações, estão vinculadas as nossas emoções nos fazendo ver algo que não é verdadeiro como se fosse. Tanto os erros como as ilusões só podem ser suplantados por um esforço consciente pelo qual através do uso de nossa racionalidade nos acercamos mais do que seja verdade.


Um dos aspectos dessa realidade é que cada um de nós pertence, enquanto indivíduo, a uma sociedade na qual somos socializados e incorporamos seus valores, crenças e modos de ser, sentir, agir e pensar e além disso pertencemos também a uma única espécie que graças a sua criatividade criou milhares de culturas, cada uma com suas peculiaridades. Esta noção deveria ampliar o discernimento acerca de nós e de como lidamos com as situações, mas na maioria do tempo nos esquecemos desse nosso pertencimento há algo maior do que nossa rotina nos leva a crer.


No campo que estamos explorando aqui há muito que se trabalhar no sentido de melhor entender o que seja espiritualidade e como podemos fazer para integrar esse aspecto em nosso cotidiano. 


Todas as religiões pregam o amor incondicional ou ágape mas o resultado que podemos ver é quase sempre seu oposto, quando alguém se identifica com algum culto na maioria das vezes age como somente merecesse respeito ou atenção alguém que compartilha das mesmas crenças que as suas, os demais são vistos como desgarrados ou infiéis. Isso no mínimo devia ser encarado com estranheza uma vez que todas as religiões procuram explicar a mesma coisa ou seja a espiritualidade, obviamente cada uma a sua maneira, sendo cada uma delas, na realidade, uma faceta do diamante que decompõe a luz divina. 


Nessa vivência física, como já dito acima, somos conformados por três aspectos diferentes do ser: o da individualidade, o da sociedade e o da espécie, sendo que podemos relacioná-los às três consciências propostas por Bert Hellinger: a consciência individual, a do grupo e a consciência espiritual. Segundo ele a consciência individual é a mais limitada, presa a dualidade Bem-Mal, aceita alguns e exclui outros, a do grupo é um pouco mais ampla em virtude das necessidades de sobreviver e manter sua integridade não exclui, mas abrange apenas os membros vinculados ao grupo, já na consciência espiritual  não há diferenciação entre Bem e Mal e entre quem pertence ou não, afinal todos os indivíduos fazem parte dela.


Alcançar esse tipo de compreensão passa obviamente por um processo de reeducação de nossa personalidade, visando a sua atualização ao nosso atual estágio de evolução tanto individual como coletivo. Não é um processo fácil, já que temos que fazer um esforço para nos desidentificarmos de algumas coisas e nos permitir abrir para outras possíveis alternativas de ser, ou seja buscar ampliar o grau dessa identificação com algo mais abrangente do que nossa consciência ordinária. 


Pensando na frase de Deepak Chopra que abre este artigo, que sugere que a espiritualidade é uma experiência pessoal deveríamos rever nossas crenças e práticas ao restabelecer nosso contato com o que nos torna seres espirituais tendo uma vivência humana. Todas as religiões desenvolveram e buscam transmitir técnicas de contato com esse aspecto ampliado de nosso ser, por exemplo: os diversos rituais de cunho religioso, danças ritualísticas, meditação, oração entre outras que podem ser feitas individual ou coletivamente.


Devemos ter atenção quando praticamos qualquer uma dessas técnicas e verificar como as praticamos. Muitas vezes fazemos esses rituais de forma mecânica, como uma obrigação diária ou semanal, como se estivéssemos conversando com algo fora de nós. A imagem que pode representar isso é a de uma criança mostrando a um adulto como é obediente esperando receber atenção e retribuições, certamente espiritualidade não é isso, já que não há nada nem ninguém fora nos avaliando. A única coisa ou ser que pode estar realizando algum tipo de avaliação e a parte de nós que se conecta ao todo, à fonte de tudo, nossa parte divina enfim. 


Quando realizadas com a devida atenção, essas técnicas apresentam algum tipo de resultado, ou seja devem repercutir em nosso ser e mostrar sua funcionalidade,  por outro lado cabe a nós estarmos atentos em que nível isso acontece: coincidências, sincronicidades, se mudamos algo em nossa personalidade no processo de nos relacionarmos com os outros, se estamos mais equilibrados emocionalmente, se estamos mais saudáveis entre várias outras coisas. O contato espiritual de alguma maneira tem que ser percebido pela consciência, para que seja aumentada nossa fé e confiança no invisível, não de forma supersticiosa, mas fundamentada numa experiência vivida em nossa realidade. 


Quanto mais ampliamos o contato com essa nossa parte interior mais nos conectamos aos aspectos mais elevados do ser, saindo do mundano e nos aproximando do divino. Ao irmos alcançando este discernimento mais percebemos que nossa alma não se apega a nada, é livre, faz o que é certo a cada momento, não se importando se é bom ou mau aos olhos dos demais, por isso ela trai como diz Nilton Bonder em seu livro “Alma Imoral”, pois ela transcende a moral, a lei e normas de conduta humanos. 


Quando nos abrimos a essa postura começamos a entender melhor o processo Vida e as múltiplas influências que existem no tempo e no espaço. Vemos o quanto ela é criativa, nos surpreendendo a cada instante. Ficamos abertos ao mundo e suas belezas, mesmo que em princípio achemos feio, desagradável ou algo semelhante. Não existe mal nem bem, na amplitude e unidade cósmica existe apenas o funcional. Essa também é uma noção que nos ajuda a sair da dualidade e procurar entender as situações a partir de outra perspectiva.